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A chegada do bebê!

 
Nada mais paradoxal do que a chegada de um bebê numa família. É um momento ansiosamente esperado e desejado e, ao mesmo tempo temido pelas aflições que suscita.


Os sonhos acalentados pelos pais, particularmente pelas mães, de como será, em geral, evocam um bebê dormindo placidamente com um sorriso nos lábios, como a bonequinha de infância da mamãe. Mas quem aparece é alguém com seu modo próprio de ser, com suas necessidades, com suas características físicas peculiares.

Todos desejam encontrar nele, algo familiar que o identifique como “um dos nossos”: Tem o nariz do pai, o pé é igual ao da mãe, os olhos são do vovô, as bochechas, da vovó... Sim, é um dos nossos, todos querem conhecê-lo, saudá-lo, o que é altamente desejado pela mãe, mas, ao mesmo tempo, ela já não tem mais a exclusividade sobre o bebê que tinha até antes do parto, qualquer pessoa pode tomá-lo nos braços. Além disso, não é o bebê dos sonhos, ele chora, e porque chora?


No ventre da mãe, o bebê se encontra no meio aquático, onde a mobilidade (até mais ou menos o quinto mês) lhe permite uma vivência lúdica: nada, salta, brinca com as mãos, com os pés, suga o dedo, boceja, dorme. A temperatura é confortável e estável. Ele não é submetido a bruscas variações térmicas. A luminosidade é diáfana, tendendo para a penumbra, isto é, sua retina não é agredida por súbitas alterações de intensidade de luz.

Ele não passa fome: seu limiar nutricional é automaticamente regulado através da placenta à qual está ligado o cordão umbilical. Dentro de sua mãe, o bebê se encontra num estado harmônico. Mesmo os ruídos que o circundam são ritmados e homogêneos, não são agudos ou estridentes: é o pulsar do coração da mãe, são os ruídos do seu aparelho digestivo e de seu aparelho respiratório, é o som de sua voz que ecoa no abdômen.

Ao nascer, o bebê passa pelo trabalho de parto e sai da penumbra para a intensidade luminosa. Sai de uma temperatura, mais ou menos estável, de 38 graus para um ambiente de, em média, 22 graus, onde o frio e o calor se alternam. Isso se junta à incapacidade do recém nascido de manter o equilíbrio térmico e à sua grande irritabilidade quando experimenta a sensação de frio.

Sai de um ambiente de ruídos conhecidos para um espaço onde há sons estridentes de instrumentos médicos batendo em cubas metálicas e de vozes, mais ou menos agudas, que comentam o último jogo de futebol ou as próximas férias. Mas, acima de tudo, ao nascer, o bebê perde um espaço continente e protetor e é manipulado, virado, desvirado, aspirado, esfregado, até ser enrolado como um charutinho permanecendo contido, mas imóvel, longe dos ruídos e odores conhecidos – num imenso espaço estático e totalmente estranho. E depois dessa exaustiva experiência, lhe resta chorar desesperado ou fechar os olhos a tudo isso e conter tanta angústia dormindo.

De repente sua taxa nutricional decresce e ele vive uma situação desconhecida e atemorizante que o toma por inteiro –que nós sabemos, mas ele não- : é a fome. E, novamente, ele chora desesperado. Se a fome puder ser mitigada no reencontro com a mãe, ele terá o alimento para o corpo e para a mente. O leite da mãe é próprio, exclusivo para cada bebê e suficiente para suas necessidades. Mas quando mama no seio de sua mãe, além desses aspectos, recupera seus referenciais, o cheiro, a voz da mãe, a continência de seus braços que lhe restituem uma situação conhecida e confortável, uma memória agradável de onde, até há pouco, se encontrava e onde permaneceu por nove meses.


A mãe, por sua vez, que já passara por mudanças muito significativas, tanto físicas como emocionais, durante a gestação e o parto, se vê, agora, com novas alterações no seu corpo, não tem mais o corpo de grávida, nem o de antes de engravidar, se vê inundada de leite e desejosa de distribuí-lo alimentando seu bebê que, nem sempre, está disposto a mamar. Sua prioridade agora é ser mãe, papel acrescentado à sua existência de filha e de esposa. Estão em jogo suas relações com toda a linhagem feminina de sua família, especialmente, com sua mãe que, agora, assumiu o status de avó com todas as suas conseqüências. É um momento delicado e de fragilidade para a mulher.

O pai, por mais participante que tenha sido durante a gravidez, não consegue alcançar dimensão vivida pela mulher que teve o bebê dentro de seu corpo. Na hora do parto, a eminência do primeiro contato com o bebê o mobiliza. Sua mulher está completamente envolvida no trabalho e ele busca desesperadamente um lugar: caminha, sem parar na “sala das preocupações” ou entra na sala de parto e assume o lugar de fotógrafo, cinegrafista, de pai, como é isto?

Como a mulher, ele também muda de status, passa de filho a pai, o que o inscreve no lado masculino de sua cadeia das gerações: agora é pai, como seu pai que passa a ser avô.

São alterações auspiciosas e angustiantes em ambas as famílias. Todas as pessoas envolvidas no nascimento de um bebê mudam de lugar, como na dança das cadeiras.

Alguém vai ficar sem lugar?

Podemos fazer espaço para um novo membro, a despeito de tantas mudanças significativas?

É uma delícia a chegada de um bebê, mas é útil não perdermos de vista os aspectos angustiantes e difíceis que se apresentam para todos.




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